quinta-feira, 9 de julho de 2009

Amor Virtual [Capítulo I. Sedução: que voz]

Amor Virtual [Capítulo I. Sedução: que voz]


Tudo iniciou no mundo virtual. Março de 1996. Descobriu-a neófita em coisas da Internet e chegou de mansinho, ensinando-a, pouco a pouco. Ganhou-lhe a confiança, em primeiro lugar, porque nunca perguntou sua idade, o que não acontecia com os demais internautas, que, mal se dirigiam a alguém, lançavam logo a pergunta: “QT anos vc tem?” Sendo a resposta mais de 25, nem existiriam despedidas. Quando muito, um simples: “OK” e um silêncio sorumbático do outro lado.

Algumas semanas depois, porque talvez ardessem de curiosidade, mais ela do que ele, a mulher escreveu: “44”. O homem teclou: “43”. A conversa virtual prosseguiu, com uma internauta medrosa de perder mais um possível amigo virtual em razão dos anos corridos nas veias. O que o tempo comprovou, jamais ocorreria.

Foi assim que Flor Morena conheceu Gengis Khan. Aliás, nomes criados pela fantasia dos dois. Elegeu-a Flor Morena, porque meses após o primeiro encontro virtual, anunciou-se ela morena de olhos negros. Elegeu-o Gengis Khan porque, aquele atrevido ousara enviar-lhe uma foto, sem que fosse pedida, de cabelos compridos, amarrados atrás, num rabo de cavalo, o que foi suficiente para estimular-lhe a fértil imaginação, que associou aquela imagem à lembrança de homens misteriosos perdidos num deserto.

Gengis Khan desconhecia a imagem de Flor Morena, enquanto esta passou a ter como ponto de referência a foto-família. Sim, porque o internauta, até então desconhecido, tratou de apresentar-se como mandam as regras do bom homem de família: enviou-lhe uma foto onde aparecia com o primeiro neto ao colo.

À época, Flor Morena estava casada; Gengis Khan, descasado. Em pouco tempo, pequenos detalhes de um malfadado casamento deixaram-se escapar por entre as linhas femininas digitadas e apagadas e digitadas de novo. Também, os problemas com a ex-mulher afloravam pouco a pouco. Tênues reclamações, somente para justificar o fato de uma mulher casada conversar com um homem descasado, pela madrugada afora, enquanto o marido dormia, pensando-a somente envolvida com diversões inocentes. A relação marido e mulher da internauta medrosa transformara-se em forte dependência um do outro, com entremeados de violência, cabendo a Gengis Khan suprir aqueles momentos de tristeza e o escolhido bem soube fazê-lo.

No primeiro chat, particular, a convite dele, sentiu-se Flor Morena entrando num motel. O corpo estremeceu, da cabeça aos pés; nas mãos, um suor nervoso; no pescoço, um coração que ritmava quente e, entre as pernas, um sexo que chorava... Medo e excitação. Ternura e fogo. Sua primeira vez... Como adolescentes, os dois. As primeiras palavras, embora tecladas em silêncio, soaram mais alto do que um primeiro roçar de peles. Sensualidade, nada mais.

Um salto no tempo revela que depois de cinco anos, a partir do primeiro encontro virtual, a doce morena descasou-se. Quando isso ocorreu, o imaginado homem do deserto, que se apresentara descasado à época, casara-se novamente. Desencontro. Desencontro insuficiente para amainar os iniciais jogos de sedução virtual. Na primeira escuta de voz ao telefone, então, quem se impressionou mais com a voz de quem, impossível dizer! Ele: “Parece uma menina!” Ela: “Que voz bonita!” E, aquelas vozes que se atraíam, começaram a se ouvir com mais continuidade. Primeiro encontro marcado e desfeito. Mais outro... e nada! Flor Morena fugia, sempre.

Um dia, então, o pacífico Gengis Khan enviou-lhe outra foto, desta vez com os ombros desnudos. Flor emudeceu. Silêncio mortalmento barulheiro. Nem um comentário ao menos, por medo de se perder aos efeitos daquela quase-nudez que, aliás, naquele momento, devido aos seus desejos insatisfeitos, surtia o efeito de nudez-total.

À noite, na cama, o marido dormiu displicente, alheio aquela veleidade toda. Ao seu lado, Flor Morena - uma mulher em fogo - buscando-se em si mesma, num silêncio desesperador, quase incontido.

Cabo Frio, 9 de julho de 2009
Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz

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