quinta-feira, 12 de julho de 2012

Pânico


Pânico!

Lanterna à mão, oferenda do padrasto. Era uma criança, ainda nem chegada aos sete anos de idade. Ao reflexo da luz, os cabelos claros pareciam flocos de ouro balouçando na “Maria Chiquinha” presa aos laços de fita engomados pela mãe.
Curiosa, descia pela escada escura. Disseram-lhe que havia um tesouro de brinquedos e doces escondido no sótão e que merecia encontrá-lo.
- Que escuro!...
Apertou os olhinhos negros, como se o gesto inocente lhe permitisse enxergar alguma coisa. Nada.
- Não tenho medo... não tenho...
Ao meio da escada lembrou-se da boneca que ficara sozinha na cama.
- Sulinha...
Ensaiou meia volta para buscá-la, mas a vontade de encontrar o tesouro foi maior. Por outro lado, a coragem inicial afastou-se. Mãozinha umedecida calcou a parede fria. O pequeno coração tocou mais forte ao som camuflado que se fizera abaixo da escada. Bobagem... não era ninguém.
- Sulinha... a mamãe volta logo... repetia baixinho.
Com a percepção de ser vigiada, sentiu-se mais segura. Afinal, anjos de asas brancas protegiam-na dia e noite.
Mal desceu as escadas, foi arrebatada ao colo de alguém, que lhe cobriu a boca.
- Calada... ou mato sua mãe!
Aquela voz...
.........................................................................
Um grito gutural saiu-lhe das entranhas. Acordou terrificada, ao jugo da falta de ar e fio de sangue descia-lhe por entre as pernas. Tremia de dor, a chorar convulsivamente, enquanto o marido, entre assustado e sonolento, sentava-se na cama.
- O que foi meu bem? Calma... estou aqui... O que aconteceu?
Luana arrojou-se violentamente para um canto do quarto e ali permaneceu em posição fetal, com o rosto escondido. O corpo, por inteiro, sacudia nervoso, como se recebesse uma carga de alta voltagem e o coração estrebuchava indômito no peito. A lingerie grudava-se ao corpo molhado.
Ao ser repelido, Carlos vigiava perplexo, sem saber como agir. Suas palavras tornaram-se inaudíveis. Ao tentar aproximar-se, um grito obstruíra seu desejo e crise convulsiva de choro ecoara no ambiente fechado. Nada vira igual! Sua mulher temia-lhe o contato.
- Acenda a luz! Acenda a luz! Eu não quero morrer! gritava Luana, sufocada à própria respiração.
Alarmado, apenas satisfez o pedido.
Dez ou quinze minutos depois, a jovem mulher foi-se acalmando, até parar de tremer e de chorar. Parecia exausta. Olhar distante... calado.
Ao pensamento, a voz longínqua sussurrava-lhe sobre o tesouro no sótão. Segredou a si mesma o medo de sentir aquele medo de uma próxima vez.

 
Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz
Rio de Janeiro, 2 de novembro de 2011 - 6h42
Ernesto Cortazar. Stranger in the night

Nenhum comentário: